Cidades como lugares para todos e para sempre

Na entrevista concedida à equipe da Olhar Cidadão para o Encontro de Ideias do Instituto EBX, o antropólogo e educador Tião Rocha, afirma que é possível tornar as cidades lugares para todos e para sempre.  Ele acredita que toda cidade pode tornar-se sustentável.Confira um trecho da nossa conversa.

Tião RochaFazer com que a vida seja viável em seu espaço, sem excluir ninguém e já incluindo as gerações que virão, é o que caracteriza uma cidade sustentável. Essa é a utopia que vem sendo perseguida em Araçuaí  pelo antropólogo e educador Tião Rocha, fundador do Centro Popular de Cultura e Desenvolvimento. Pioneira do movimento Cidades Sustentáveis – hoje uma rede com dezenas de municípios mundo afora –, a pequena Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, vem desenvolvendo desde 2005 projetos que já a tornaram referência internacional nesta área, como o de captação de água da chuva para a produção na região semi-árida.

Encontro de Ideias – Uma cidade sustentável é a utopia do século XXI?

Tião Rocha - Eu acho que é uma delas. Pensar em cidades sustentáveis é uma utopia, não a do sonho impossível, mas no sentido do que é necessário que se realize, ao lado da ideia de um mundo sustentável.

EI – O que caracterizaria uma cidade sustentável?

TR: Ser um lugar onde a vida seja viável para todos e para sempre. Não pode ficar ninguém de fora. É a cidade que não separa, não exclui, não segrega entre ricos e pobres, periferia e centro, luxo e miséria – ela tem de ser pra todos. Por isso que é uma utopia. E tem ser pra sempre: não pode ser só durante um determinado tempo. Esse é o grande desafio.

EI – E o que pode viabilizar, tornar uma cidade sustentável?

TR: É fazer com que a vida que seja viável. Nós entendemos que para isso é preciso desenvolver três grandes programas. O primeiro é Meu Lugar é Aqui, pois é o lugar onde o habitante se realiza como pessoa e como cidadão do mundo, sem precisar sair para ir tentar viver sua vida com dignidade. Outro programa se chama Cuidando dos Tataranetos, que é como produzir um mundo melhor para os que virão e que nem conheceremos. E educar segundo o documento talvez mais importante que já se produziu, a Carta da Terra, que são 16 artigos e princípios que orientam como que nós, humanos, terrestres, devemos viver em harmonia, com os outros e com a natureza. Os princípios estão ali. As condições materiais, nós já temos. O que falta é transformar isso em uma causa.

 

EI – Qualquer cidade pode se tornar sustentável?

TR: Pode. Essa é outra questão que se coloca na construção dessa utopia. O Brasil tem mais de 5.500 cidades, quase 95% delas com população inferior a 50 mil habitantes. A maioria delas não está em condições de seca, como Araçuaí, e tem como garantir que seus cidadãos permaneçam ali, com uma vida digna. Uma cidade como São Paulo, também é possível, mas tem de mudar tudo: o jeito de produzir, de locomover, de organizar. Do jeito que é, é insustentável, pois não foi feito para as pessoas, mas para atender a uma demanda do modelo econômico, que é seletivo, excludente, que valoriza mais os meios que os fins. Enfim, as grandes metrópoles precisariam ser repensadas, reestruturadas em outra lógica. Mas nas médias e pequenas cidades, é possível.

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